Ilustrações: 1- foto do poeta Antônio Sodré declamando 2- "Dom Quixote", De o pintor mato-grossense Adir Sodré; 3- "Sexo Todo Mundo Vê!" da pintora mato-grossense Vitória Basáia.
Tristíssima, como é às vezes a vida, a nossa coluna retorna esta semana para noticiar a morte do poeta "Antônio Sodré", uma das grandes vozes da poesia contemporânea em Mato Grosso, que faleceu nas primeiras horas deste sábado (19/02/2011), deixando a lua cheia de sol em seu lugar. Segundo consta-nos, o poeta teria ido participar de um sarau de poesia na noite de sexta-feira (18/02) no bairro Cophema, em Cuiabá, e após declamar seus poemas ele sofrera um enfarto fortíssimo, tendo que ser resgatado pelo SAMU e encaminhado ao hospital, onde teria sofrido outros ataques que vieram a vitimá-lo nas primeiras horas do sábado.
Saía de cena, não dos corações daqueles que o conheceram, o "Poeta de la Transmutación e de la Trancedencia!", como ele mesmo gostava de se denominar, após ter militado na poesia independente por mais de 30 anos e ter deixado seus 2 livros de poemas "A Besta Poética" - 1984 e "Empório Diversos" de 2004 e ter participado de 2 CDs com o grupo litero-musical "Caxemir-Bouquê", do qual fazia parte. Foi a nós, da coluna "Poesia Comovida", que o poeta concedeu a sua última entrevista em junho do ano passado, onde falava-nos de si, de seu trabalho e de seus planos para o próximo livro "Lirismo à Flor da Pele", do qual na ocasião publicamos um poema inédito. Livro este que o poeta provavelmente não chegou a concluir. Confira: http://revistacontemporartes.blogspot.com/2010/06/o-poeta-matogrossense-antonio-sodre.html
Para nós, que conhecemos o poeta desde o início da década de 80, e que desde então nunca deixamos de visitá-lo na casa de sua mãe a cada vez que regressamos ao Mato Grosso, a querida dona Joaquina do bairro Pedregal, para trocar figurinhas de poesia ou para nos encaminharmos a saraus, bares ou mesmo à casa de nossa querida e genial amiga pintora Vitória Basáia e de seu filho e poeta Juliano Moreno, espaços onde a poesia sempre soube ser o prato principal, perder o poeta não é nada legal! Quando voltarmos à Cuiabá teremos mesmo que parodiar o Manoel Bandeira da ocasião da perda de Mário de Andrade e fingir que o poeta não está lá porque foi às cachoeiras da Chapada dos Guimarães ou algum outro recanto conhecido...
Era conhecido como Antônio, Antônio Sodré ou apenas Sodrezinho, em referência ao seu irmão mais novo, o grande pintor matogrossense Adir Sodré, que foi um dos incentivadores da poesia dele. Era poeta e livreiro, durante anos dirigiu um point de compra e venda de livros usados no campus da UFMT em Cuiabá, de onde tirava o seu sustento. Uma pessoa culta e simples, que encantava as pessoas com seus poemas curtos de forte musicalidade e que levava uma vida que contrariava os comuns: onde o carro da poesia aparecia sempre na frente dos bois.
Por enquanto ficamos com mais alguns versos do poeta Antônio Sodré, que escreveu pouco, nos deixou tão cedo e que, mesmo assim, soube deixar o mundo por onde passou com um pouco mais de poesia! Bravíssimo! Vá com as musas, meu bardo!
Por enquanto ficamos com mais alguns versos do poeta Antônio Sodré, que escreveu pouco, nos deixou tão cedo e que, mesmo assim, soube deixar o mundo por onde passou com um pouco mais de poesia! Bravíssimo! Vá com as musas, meu bardo!
Uma pequena Homenagem
Desde que me mudei de Cuiabá em 1987, sempre que regressava à cidade aportava no bairro Pedregal, onde também morava o poeta Antônio Sodré, e costumeiramente ia vê-lo, assim que possível, para trocarmos figurinhas, para discutirmos o caminho das pedras da poesia, para ser mais preciso.
Nestas ocasiões, um ou outro sempre tinha um poema novo ou uma idéia de poema para mostrar e para constatar a opinião do outro. Este "bate-bola" era importante, porque além de amigos a gente se respeitava muito como poeta, ambos tínhamos dificuldades de escrever e também certo senso-crítico que pode ir sendo melhorado com o passar do tempo e com as nossas novas leituras.
Dessas nossas discussões, vários poemas dele ou meu puderam ser amadurecidos ou simplesmente tiveram que ser sacrificados. Recordo-me especificamente de uma idéia de poema que ele tinha que me fascinara de imediato. A idéia de escrever um poema chamado "Fissíl", do qual ele tinha apenas 2 ou 3 versos que ele repetia-me durante anos com uma ou outra variação. A riqueza de assonância e aliteração destes versos tornava o poema difícil de ser composto e, ao mesmo tempo, me fissurava para que ele aprontasse logo o poema. Certa vez, brincando evidentemente, eu cheguei a ameaçá-lo:
- Se você não escrever logo este poema, eu irei escrevê-lo!
Parece que a brincadeira funcionou, porque pouco tempo depois ele me mostrou o poema, que ficou realmente muito bom. Fiquei sentindo uma alegriazinha boba de padrinho, como se ele de fato fosse me dar o poema para batizar. Por isto sempre tive um carinho especial por este poema.
No ano passado, quando fizemos a sua última entrevista, tivemos a oportunidade de ler este poema juntos uma vez mais, então eu tive a idéia de escrever algo para homenageá-lo (o poema e o poeta), acabei compondo outro poema, este. Passagens do Impossível... Esse texto foi escrito aos poucos, em sua homenagem e conclui só agora no final de janeiro. Tinha a intenção de mostrar ao poeta meados deste ano, quando pretendo ir à Cuiabá, mas o poeta não pode esperar... Por isto, amigos meus, gostaria de compartilhar estes poemas, aqui com vocês:
Desde que me mudei de Cuiabá em 1987, sempre que regressava à cidade aportava no bairro Pedregal, onde também morava o poeta Antônio Sodré, e costumeiramente ia vê-lo, assim que possível, para trocarmos figurinhas, para discutirmos o caminho das pedras da poesia, para ser mais preciso.
Nestas ocasiões, um ou outro sempre tinha um poema novo ou uma idéia de poema para mostrar e para constatar a opinião do outro. Este "bate-bola" era importante, porque além de amigos a gente se respeitava muito como poeta, ambos tínhamos dificuldades de escrever e também certo senso-crítico que pode ir sendo melhorado com o passar do tempo e com as nossas novas leituras.
Dessas nossas discussões, vários poemas dele ou meu puderam ser amadurecidos ou simplesmente tiveram que ser sacrificados. Recordo-me especificamente de uma idéia de poema que ele tinha que me fascinara de imediato. A idéia de escrever um poema chamado "Fissíl", do qual ele tinha apenas 2 ou 3 versos que ele repetia-me durante anos com uma ou outra variação. A riqueza de assonância e aliteração destes versos tornava o poema difícil de ser composto e, ao mesmo tempo, me fissurava para que ele aprontasse logo o poema. Certa vez, brincando evidentemente, eu cheguei a ameaçá-lo:
- Se você não escrever logo este poema, eu irei escrevê-lo!
Parece que a brincadeira funcionou, porque pouco tempo depois ele me mostrou o poema, que ficou realmente muito bom. Fiquei sentindo uma alegriazinha boba de padrinho, como se ele de fato fosse me dar o poema para batizar. Por isto sempre tive um carinho especial por este poema.
No ano passado, quando fizemos a sua última entrevista, tivemos a oportunidade de ler este poema juntos uma vez mais, então eu tive a idéia de escrever algo para homenageá-lo (o poema e o poeta), acabei compondo outro poema, este. Passagens do Impossível... Esse texto foi escrito aos poucos, em sua homenagem e conclui só agora no final de janeiro. Tinha a intenção de mostrar ao poeta meados deste ano, quando pretendo ir à Cuiabá, mas o poeta não pode esperar... Por isto, amigos meus, gostaria de compartilhar estes poemas, aqui com vocês:
Passagens do Impossível
(Para Antônio Sodré, in memoriam.)
Se o escombro do assombro fosse um verso
E o universo, em meu ombro, um benefício
Se o acesso da festa fosse físsil
e o difícil se fizesse fácil...
Se a moça do sonho fosse tátil
e, de fato, florisse aos meus tratos
Se a flor que me desse me sorrisse
e, na flor do seu viço, me afagasse.
Se o desejo alcançado me bastasse
e a dor, que me mora, desistisse
Se a morte, na hora, se matasse
E, na última cartada, eu conseguisse...
Eu não seria de esmar, de errar tanto
Nem teria este ar de degolado
Ficaria alegrado no meu canto
Com o meu canto de alento, de legado.
Poema de Altair de Oliveira
Antonio somente me contou a dor
Fonte: Poeta Altair de Oliveira (poesia.comentada@gmail.com), poeta, escreve quinzenalmente às segundas-feiras no ContemporARTES a coluna "Poesia Comovida"
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Antonio somente me contou a dor
Que consumia sua alegria
Escondia-se para chorar
Porque a dor do poeta o consumia...
Uma dor que a gente não via
Das asas do pensamento.
Guiou-se em busca do sentido
E se entregou aos prazeres sem sentido.
Quando declamava seu coração sossegava.
Escondia a tristeza
Que não era vista por qualquer um
Hoje o poeta não escreve mais...
Não declama mais nada...
Chegou a sua hora
Sua vida ficou impressa nas palavras
Somente a recordação dos seus escritos
As idéias que compartilhou...
Escritas tiradas da intimidade do seu ser
Que o tornará o poeta vivo para sempre...
Por: Sandra Barbosa®